FRANCISCO PULIDO VALENTE

1884 - 1963

Retrato de Francisco Pulido Valente da autoria de João Abel Manta,

capa da segunda edição do livro “In memoriam”.

Francisco Pulido Valente foi um clínico invulgar, professor ilustre e grande reformador da medicina portuguesa durante a primeira metade do século vinte.

Nasceu de pai e mãe alentejanos na cidade de Lisboa a 25 de Dezembro de 1884 e aí fez toda a sua educação e exerceu a profissão de médico e professor. Demitido da Universidade em 1947 pelo Governo da Ditadura continuou ainda a sua actividade clínica privada durante alguns anos e veio a morrer a 20 de Junho de 1963.

1ª foto de Pulido Valente

Pais de Francisco Pulido Valente, Francisco Manuel Valente e Maria Bella Pulido Valente

 Francisco Pulido Valente e o irmão

O jovem médico Francisco Pulido Valente no laboratório

Depois de um curso brilhante na Escola Médica-Cirúrgica de Lisboa que terminou com uma tese inaugural sobre a histeria, Pulido Valente inicia a sua carreira profissional em 1911. Médico efectivo da Junta Consultiva dos Hospitais Civis de Lisboa começou por ser nomeado primeiro assistente da cadeira de Psiquiatria de que Júlio de Matos era o primeiro professor titular.

A sua atracção pela Psiquiatria e a sua curiosidade científica levaram-no, cedo na sua carreira, a iniciar uma investigação detalhada sobre os mecanismos causadores da doença na sífilis terciária ou cerebral. Os resultados desses notáveis trabalhos experimentais que realizou no Instituto Bacteriológico Câmara Pestana até 1917 estão documentados em três monografias reconhecidas internacionalmente.

Tendo-se então alistado no Corpo Expedicionário Português serve em França de 1917 a 1919. Desmobilizado, inicia a carreira académica e, após uma série de brilhantes concursos, é nomeado professor ordinário de Patologia e Terapêutica Médicas em 1921, e encarregado da regência  da 2.º Clínica Médica em 1924. 

A sua aprendizagem intensiva de técnicas laboratoriais e a sua vasta e actualizada informação, que incluía a leitura da literatura médica alemã, a mais avançada na época, fazem com que seja pela sua mão que se introduz em Portugal uma nova Medicina já então praticada nos países mais avançados. A Medicina intuitiva e focada sobre o sintoma dá lugar à Medicina baseada no diagnóstico, na integração dos dados clínicos e laboratoriais que conduz ao reconhecimento de um particular disfunção. Pretende-se agora explicar os sinais e sintomas da função alterada em termos da resultante da interacção entre o agente agressor (ao nível de célula, tecido, órgão, sistema e organismo) e a reposta defensiva do organismo agredido. 

 Francisco Pulido Valente no seu consultório

Esta visão integrada é transmitida ao estudante e ao médico interno durante a discussão do caso clínico, à beira do doente; é ela que através desta prática constitui a base da revolução da ciência médica portuguesa com que Pulido Valente se identificou.

Dentro desta perspectiva de modernização Pulido Valente incentiva os estágios na Alemanha de numerosos discípulos e colegas e consegue reter em Portugal um notável patologista alemão fugido ao nazismo, o professor Freidrich Wohlwill. As reuniões  clínico-patológicas do Hospital de Santa Marta sob a orientação de Pulido Valente e Wohwill, e em que se discutiam casos clínicos de difícil diagnóstico, ficariam célebres pelo seu alto nível científico e pedagógico.

Para além dos artigos sobre a sífilis, Pulido Valente apenas nos deixou monografias sobre temas que o interessaram. Divulgador excepcional pela compreensão profunda dos temas e pelo estilo depurado, são modelares as suas lições sobre a diabetes e os seus trabalhos sobre as leucemias e a teoria da circulação normal e patológica. Neste último, revela a sua preparação matemática, invulgar num não especialista, que em parte adquirira com o seu amigo Bento de Jesus Caraça.

Altaneiro no porte e autoritário no modo, por vezes faccioso, implacável  perante a mediocridade pretensiosa do meio, a sua capacidade intelectual invulgar e a limpidez do seu raciocínio faziam com que as suas argumentações demolidoras fossem temidas por alunos e colegas. Extraordinários eram ainda a dedicação e desvelo  que punha no trato dos pacientes e refinado o seu sentido de humor.

A sua demissão da Universidade em 1947, juntamente com vários outros professores, constituiu um duro e irreparável golpe no processo de renovação da medicina portuguesa.

A juntar à sua carreira médica excepcional, Pulido Valente foi um cidadão interveniente e um homem de cultura com um posicionamento filosófico na área do positivismo empírico.

Destacado membro da organização estudantil de Lisboa durante a greve académica de 1907 participou na campanha eleitoral do General Norton de Matos e foi membro da Comissão de Honra da Candidatura do General Humberto Delgado em 1958.

Conviveu muito de perto com matemáticos, físicos, escritores, pensadores, músicos e artistas, e a tertúlia que reunia no seu consultório, ilustrativa da vida intelectual da Lisboa do seu tempo, está expressivamente captada na pintura de Abel Manta intitulada A Leitura, na qual Aquilino Ribeiro lê para um grupo de personalidades notáveis que rodeia Pulido Valente.

(Biografia foi escrita por João Pedro Pulido Valente Monjardino, neto do Prof. Francisco Pulido Valente)

“Homem de grande cultura científica, competência excepcional, visto como um renovador na Faculdade de Medicina […] grande clínico, um dos maiores do País, é autor de vários e valiosos trabalhos de investigação entre os quais: Introdução ao Estudo da Histeria; A Etiologia e a Patologia da Paralisia Geral; Um caso de Actinomicose; Estudo Clínico e Experimental; Sobre Vinte e um Casos de Encefalite Letárgica.” – retirado do artigo da Enciclopédia Luso-Brasileira.